Passos Coelho disse há dois anos (10.12.2008) que “o Governo tem estado bastante bem nas respostas que tem encontrado para a crise financeira, que, de resto, não são respostas muito originais, são concertadas ao nível europeu, mas que têm funcionado bem em Portugal'.
Ora, passado pouco tempo e depois de sermos fortemente assolados pela crise internacional de que Portugal não teve culpas específicas, eis que Passos Coelho inverte completamente o seu discurso e até parece que de um momento para o outro passámos de exímios a mentecaptos.
Não. Não fizemos essa evolução, nem nós nem todos os outros países europeus que estão a tomar fortes medidas restritivas. Vejamos só o caso dos défices de partida e da dívida pública para já não falar nas medidas concretas que irão afectar a generalidade das economias europeias.
Valor dos défices: Irlanda – 14,4%; Reino Unido – 11,4%; Espanha – 11,1%; Letónia – 9,4%; Portugal – 9,3%; Eslováquia – 7,9%; França – 7,5%; Polónia – 7,2%.
Dívida Pública: Itália – 116%; Bélgica – 96,2%; Hungria – 78,4%; França – 78,1%; Portugal – 76,1%; Alemanha – 73,4%.
Ou seja, o problema não é só português e ultrapassa em muito a Europa. É um problema global criado pelos especuladores financeiros internacionais assente em engenharias financeiras que não estavam traduzidas na economia real.
E face a isto o PSD e Passos Coelho, agora, faz de conta que não vê a crise internacional e numa estratégia meramente partidária, pessoal e assente em lobbys, quer a todo o custo provocar uma crise que, aos seus olhos, lhe possa fazer ganhar umas eleições nem que para isso tenha que prejudicar gravemente o país, lançando-o numa deriva de forte ataque especulativo por parte dos “donos do dinheiro”.
E é por isso que eu acho que o PSD e Pedro Passos Coelho não estiveram nestas negociações, com o Governo, de boa-fé. Senão vejamos aquilo que ele disse, durante as negociações, num jantar de militantes em Almada e tudo aquilo que ele vem dizendo aos portugueses desde o Verão. Aliás Passos Coelho tudo tem feito para abrir uma crise em Portugal. Ao ameaçar, ao fazer chantagem e ao lançar ultimatos ao Governo.
E, portanto, quando alguém vai para uma negociação e coloca em cima da mesa objectivos que não materializa, que não traduz em termos orçamentais algo não está bem. O PSD bem sabe que há um conjunto de compromissos internacionais que não podem ser postos em causa.
Objectivamente, o PSD esteve, neste processo, a fazer, meramente, um jogo de sombras. Sentou-se à mesa das negociações forçado e fugiu na primeira curva da estrada de forma leviana. Foi aliás sempre o que Passos Coelho pretendeu, romper com as negociações.
Agora, há uma certeza que podemos ter, é que quem vai pagar, caso o Orçamento não seja viabilizado, será Portugal e os portugueses.
Para o Governo a aprovação do Orçamento sempre foi tido como um factor importante para a credibilidade internacional de Portugal independentemente dos calculismos partidários. Aliás, disse-o ab initio ao aceitar negociar e ao disponibilizar-se para aceitar alterações que fossem concretas.
Há momentos em que os líderes não podem ter calculismos, têm que ter dimensão institucional. Para o PS, Portugal estará sempre primeiro. E assumir este orçamento de forte restrição está para além de quaisquer estratégias partidárias.
O PS e o Governo esperam até ao último minuto por um assomo de bom senso por parte de Passos Coelho. O país não lhe perdoará caso o não faça.