Paulo Marques TOC e docente na Escola Superior de Tecnologia e Gestão de Lamego – IPV |
As grandes novidades prendem-se com a nova obrigação de os retalhistas ou vendedores ambulantes terem que emitir fatura, mesmo que o cliente seja um particular consumidor final, e com o fim dos documentos equivalentes à fatura, como os talões de venda, as vendas a dinheiro ou as notas de lançamento. Operações sujeitas a IVA apenas podem ser tituladas por faturas, que no essencial mantêm as características já conhecidas, e por faturas simplificadas, uma nova figura de fatura que, como a designação indica, é menos exigente em termos de conteúdo obrigatório.
Nos termos do artigo 29.º do Código do IVA (CIVA), é obrigatório emitir uma fatura por cada transmissão de bens ou prestação de serviços realizadas, em todos os setores de atividade, qualquer que seja a qualidade do cliente (seja uma empresa ou seja um particular consumidor final) e mesmo que o cliente não solicite a sua emissão. No recebimento de adiantamentos passa também a ser obrigatória emissão de fatura. E está expressamente previsto no mesmo artigo que não é permitida aos sujeitos passivos a emissão e entrega de documentos de natureza diferente da fatura para titular a transmissão de bens ou prestação de serviços aos respetivos adquirentes ou destinatários, sob pena de aplicação das penalidades legalmente previstas. As notas de débito e as notas de crédito continuam a utilizar-se, mas somente como documentos retificativos de faturas previamente emitidas e deverão fazer referência à fatura a que respeitam e as menções desta que são objeto de alterações.
Como se verifica, houve um reforço da obrigação de faturação, ficando dispensados apenas os sujeitos passivos que pratiquem exclusivamente operações isentas de IVA, como sejam os empresários de reduzida dimensão enquadrados no regime especial de isenção do artigo 53.º do CIVA e as empresas que desenvolvem atividades isentas previstas no artigo 9.º do CIVA (médicos, enfermeiros, artistas, formação profissional, serviços funerários, locação de bens imóveis, só para dar alguns exemplos). Nestes casos, dispensa de faturação significa apenas possibilidade de simplificação, não ficando obrigados a emitir um documento com todas as características de uma fatura. Mantém-se a obrigação de emissão de um documento – no caso, o recibo – para efeitos de titular o rendimento obtido e sujeição ao respetivo imposto e para entregar ao cliente. Os comerciantes enquadrados no regime dos pequenos retalhistas (artigo 60.º do CIVA) são agora obrigados a emitir fatura.
A fatura simplificada está prevista no artigo 40.º do CIVA e a sua utilização pelos operadores económicos cumpre a obrigatoriedade de emissão de fatura prevista no artigo 29.º, mas com âmbito de aplicação mais limitado. Além de só ser permitida para titular transmissões de bens e prestações de serviços cujo imposto seja devido em território nacional (exclui operações como as exportações e as transmissões intracomunitárias de bens), só pode ser emitida nas seguintes situações:
Transmissões de bens feitas por retalhistas ou vendedores ambulantes a não sujeitos passivos, quando o valor da fatura não for superior a 1.000 €; Outras transmissões de bens e prestações de serviços em que o montante da fatura não seja superior a 100 €.
Na primeira situação, a fatura simplificada é utilizada por empresas que desenvolvem atividade comercial a retalho ou de venda ambulante, unicamente quando os seus clientes forem particulares consumidores finais e o valor da mercadoria não ultrapassar os 1.000 €. Se um retalhista vende 1.300 € de mercadorias a um cliente particular, ou um supermercado vende 400 € de produtos a outra empresa sujeito passivo de IVA, nos dois casos deixa de se poder emitir fatura simplificada, sendo obrigatória a fatura.
Na segunda situação, a fatura simplificada é admitida tanto para transmissões de bens como para prestações de serviços, desde que o seu valor não exceda os 100 € e qualquer se seja a qualidade do cliente (empresa sujeito passivo de IVA ou particular consumidor final). Um grossista pode emitir fatura simplificada se vender um eletrodoméstico no valor de 90 € a uma empresa sujeito passivo de IVA (é oportuno referir que este documento confere direito à dedução de IVA no adquirente – nos termos dos artigos 19.º e seguintes do CIVA, desde que preenchido com todos os requisitos da fatura simplificada). Mas um restaurante fica obrigado emitir uma fatura para titular uma despesa de 140 € efetuada por um particular.
Nas atividades de prestações de serviços de transporte, de estacionamento, portagens e entradas em espetáculos, quando seja emitido um bilhete de transporte, ingresso ou outro documento ao portador comprovativo do pagamento, este substitui a obrigação de emissão de fatura. Nas transmissões de bens efetuadas através de aparelhos de distribuição automática, que não permitam a emissão de fatura, aquela obrigação é cumprida mediante o registo (em folha de caixa e contabilístico) das operações. Em qualquer caso mantém-se a obrigação de registo das transmissões de bens e das prestações de serviços efetuadas.
O artigo 40.º, n.º 2 do CIVA prevê também os elementos a constar na fatura simplificada e os requisitos da fatura constam no artigo 36.º, n.º 5. Há algumas diferenças de conteúdo facilmente constatáveis pela comparação do texto dos artigos referidos. Não vamos desenvolver estas diferenças, até porque os fornecedores de programas ou equipamentos eletrónicos de faturação, bem como as tipografias, incluíram as especificidades das faturas e das faturas simplificadas nos respetivos produtos que fornecem. Vamos apenas esclarecer os elementos identificativos do cliente que podem, ou devem, constar em cada uma delas.
As faturas simplificadas apenas têm obrigatoriamente espaço para o número de identificação fiscal (NIF) do adquirente ou destinatário. Significa que nome e morada do cliente não têm que constar na fatura simplificada. E se nela forem incluídos? Não nos parece que advenha daí qualquer problema, desde que a fatura simplificada contenha toda a restante informação indispensável. Passa a ter informação a mais e estão os empresários a complicar aquilo que o legislador simplificou. O NIF do adquirente ou destinatário é de preenchimento obrigatório numa fatura simplificada? Sim, se o cliente for sujeito passivo de IVA (é mesmo necessário para que este possa deduzir o IVA se tal lhe for permitido). Se o cliente for um particular consumidor final, a fatura simplificada deve conter o seu NIF apenas quando este o solicite. Concluindo, é possível emitir faturas simplificadas para particulares sem indicação do NIF.
Nas situações em que os empresários emitem faturas, por opção ou por impedimento de emissão de fatura simplificada, já nos deparámos com a complicação do procedimento, ao exigir-se ao cliente o fornecimento de nome, morada e NIF para todas as faturas. Também aqui não adianta complicar o que é simples. A regra geral prevista na alínea a) do número 5 do artigo 36.º do CIVA que obriga à inclusão dos nomes, firmas ou denominações sociais e a sede ou domicílio do fornecedor de bens ou prestador de serviços e do destinatário ou adquirente, bem como os correspondentes números de identificação fiscal dos sujeitos passivos de imposto aplicar-se à na íntegra sempre que o cliente for outra empresa, sujeito passivo de IVA.
Já quando o cliente for um particular consumidor final, há que ter em atenção o disposto nos números 15 e 16 do mesmo artigo. A indicação da identificação e do domicílio do adquirente ou destinatário que não seja sujeito passivo não é obrigatória nas faturas de valor inferior a 1.000 €, e apenas deverá constar quando o cliente solicite que a fatura contenha esses elementos. Assim, nome e morada do cliente particular consumidor final só devem ser obrigatoriamente inseridos em faturas de valor superior a 1.000 €. Nas restantes, é opção do cliente. Já quanto à indicação na fatura do NIF do adquirente ou destinatário não sujeito passivo é sempre obrigatória quando este o solicite. Ou seja, a inclusão do NIF de um cliente particular consumidor final numa fatura nunca é obrigatória, mas se este o solicitar deverá ser inserido. Resumindo, para faturas de valor inferior a 1.000 €, fica ao critério do cliente particular fornecer ou não o seu nome morada e NIF, sendo possível a emissão de faturas com nome e morada mas sem NIF, ou de faturas apenas com o NIF, mas sem nome e morada. Esta última situação será muito frequente, principalmente nos setores de atividade que conferem aos consumidores finais um incentivo fiscal correspondente a 5% do IVA constante das faturas em que tenha sido inserido o seu NIF.
Uma nota final para referir que nas faturas processadas através de sistemas informáticos, todas as menções obrigatórias, incluindo o nome, a firma ou a denominação social e o NIF do sujeito passivo adquirente, devem ser inseridas pelo respetivo programa ou equipamento informático de faturação. Com uma fatura de gasóleo informatizada, onde não foi impresso o NIF do cliente, este não poderá deduzir o respetivo IVA, mesmo que lá escreva o NIF. Já era este o entendimento da Administração Fiscal, mas com a inclusão desta norma no CIVA eliminam-se as dúvidas e vamos definitivamente deixar de ouvir “se precisar ponha lá o número de contribuinte à mão”.