No passado
dia 23 de Novembro, Daniel Oliveira apresentou o seu livro “A
Persistência da Memória” na FNAC de Viseu. A obra é o seu primeiro romance, e
conta a história de uma mulher que não se consegue esquecer de tudo o que
viveu.
Segundo
o autor “…O mais difícil foi colocar-me
ou pelo menos tentar ver o mundo pelos olhos de uma mulher. O que é tarefa
quase impossível porque não há duas mulheres iguais, as mulheres têm uma
complexidade que é muito particular (…) Em cada mulher há um mundo por
descobrir. Neste livro esta mulher, esta Camila que me propus a criar, vê também
o mundo de uma forma muito diferente. (…) As mulheres vivem grande parte das
emoções que são transversais a todos de uma forma, creio eu, muito mais
intensa, muito mais visceral ou pelo menos mostram-no muito mais do que os
homens. (…) A visão feminina de uma série de emoções, a separação, o processo
de sedução, a perda de alguém, estão aqui muito marcadas no livro que parte de
um extremo, da mulher para quem o passado não passou…”
O enredo passado entre três locais,
Lisboa, Nova Iorque e Rio de Janeiro dá-nos a conhecer a doença da personagem
principal, Camila, algo raro chamado de Síndrome de Memória Superior. “… Esta mulher vive todos os amores e todas
as desilusões com a intensidade do primeiro momento. Com a intensidade que nós
temos quando vivemos alguma coisa pela primeira vez.. (…) Para esta mulher
todas as separações são permanentes, todas as dores são permanentes, a perda de
alguém tem também uma dor permanente e portanto ela vive todo esse turbilhão de
emoções de uma forma muito particular…”
Para Daniel “Nós somos muito a nossa memória,
é ela que nos dá a nossa identidade (…) Nós somos a nossa memória no sentido em
que estamos a ver uma coisa mas somos tudo aquilo que trouxemos connosco até ao
momento que a vemos. (…) É ela que define os nossos princípios morais, a nossa
relação com os outros e a forma como nós perdoamos ou não aquele que nos
magoaram…” O apresentador de televisão refere ainda que “espera que possam para além de ler o livro,
senti-lo. Há muitas ideias nas entrelinhas, no subtexto, há muitas frases que
querem dizer mais do que uma coisa portanto o grande privilégio que tem sido
apresentar o livro e perceber a reação das pessoas é tão mais feliz para mim,
se o conseguirem sentir…”.
No final da apresentação o Notícias de Resende esteve um pouco à conversa com o
autor para saber mais acerca d’ “A Persistência da Memória”.
Notícias de Resende-
O Daniel fala tão bem do universo feminino neste livro como se fosse mesmo uma
mulher. Como consegue? Qual é o segredo?
Daniel Oliveira-
Não sei se há um segredo. Acho que exige talvez uma atenção especial a esse
universo, que é um que me fascina particularmente e tentar olhar um pouco para
além daquilo que é visível, óbvio. Portanto eu procuro sempre olhar para o que
é mais complexo e como universo feminino é algo que, como já referi, me fascina
acho que estavam reunidas as condições para que eu optasse por este caminho.
N.R.-
Houve alguma pessoa em especial que o inspirasse para a criação da Camila?
D.O.-
Não. Partiu da minha cabeça, não há ninguém em especial para a Camila. Esta personagem
não existe mas existe em cada uma das mulheres, em alguns traços que ela tem,
em algumas formas como ela reage a muitas situações. Acho que também está relacionado com o olhar
que eu tento ter sobre determinadas coisas mas neste caso com uma pessoa que
não existe. Nesse sentido a inspiração é tudo aquilo que acontece, basicamente
todas as pessoas que eu conheço e tudo aquilo que vivi.
N.R.-
Existe uma personagem, a Eva Lacerda, que sofre de alzheimer. Foi mesmo de
propósito para haver o confronto entre uma que se lembra de tudo e outra que
pouco se recorda?
D.O.-
Sim. A ideia foi ter os dois extremos da questão da memória, de perceber que a
felicidade se calhar está sempre no meio das coisas, no equilíbrio que nós
temos das coisas e da vida. Uma mulher que se lembra de tudo não consegue ser
feliz e uma que se vai esquecendo de tudo também não consegue. Nós somos a
fatia do meio, basicamente, é nesse equilíbrio e na forma como nós conseguimos
criar essas memórias para aqueles que nos são próximos que está a nossa
felicidade ainda que por vezes não nos apercebamos disso na voracidade do
dia-a-dia.
N.R.-
Se até então havia os livros da “Alta Definição” agora o primeiro romance. De
alguma forma o “Alta definição” tem também um espelho neste livro?
D.O.-
Não, quer dizer só se for pela intensidade das emoções. Acho que as pessoas que
me costumam ver no “Alta Definição” vão reconhecer um traço de intensidade de
emoção em cada uma das emoções, sejam positivas ou negativas, que é muito
presente. Há essa coerência que eu gosto de colocar nas coisas que faço. As
coisas têm nervo, têm intensidade, daí pode haver uma identificação.
N.R.-
As histórias com que se cruza no programa também serviram para o livro?
D.O.-
Não. Houve muitas histórias do “Alta Definição” que me marcaram mas não para o
livro.
N.R.-
O livro tem tido um sucesso fantástico. Estava à espera?
D.O.-
Quando estava sozinho a escrever em casa nunca imaginei que a repercussão
pudesse ter esta rapidez sobretudo e este impacto junto do público feminino.
Sabia que a história era forte e que tinha ingredientes que pudessem entreter
as pessoas que é um dos principais objectivos do livro. É também um dos
principais de quem compra um livro, ter um bom momento. Não há leitura sem
prazer. Tem sido muito reconfortante perceber a forma como as pessoas têm
reagido a esta história e a estas frases, a forma como leem o livro, o facto de
o lerem todo de uma vez ou devagar porque o querem saborear ou porque querem
acompanhar com um copo de vinho tinto ou com um chocolate. É tudo muito
surpreendente para mim, nunca tal me passou pela cabeça.
Sinopse “A Persistência da Memória”
Camila está em conflito permanente com a sua consciência.
Dotada de uma aptidão rara, a que a medicina designa por síndrome de memória
superior, tem a capacidade de se recordar ao pormenor de todos os
acontecimentos da sua vida, mesmo aqueles que desejaria esquecer. Nesta teia de
emoções, onde se misturam passado e presente, amor e perda, culpa e prazer,
Camila busca a liberdade que a memória não lhe concede, sobrevivendo entre
relações extremas e perversas. Um segredo inconfessável e a frágil fronteira
entre sonho e realidade atravessam este romance desconcertante sobre a
intimidade de uma mulher perseguida pelas sombras da sua própria história.
Raquel Evangelina e José António Pereira