A discussão sobre a governação, as oportunidades e os desafios dos territórios rurais, tendo como horizonte a programação dos próximos fundos comunitários e o desenvolvimento do Território Douro Verde, foi uma vez mais o motivo para, num contexto informal, cruzar conhecimentos internos e exteriores à região, ou como mais à frente chamou um dos intervenientes, a “ecologia dos saberes”, ou seja, o cruzamento dos saberes académicos com os saberes não académicos. Como oradores, o Serão contou com: Luís Ramos, docente da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, Helena Madureira, da Universidade do Porto, Suzan Fartaj, das Termas de Caldas de Arêgos, João Luís Fernandes, da Universidade de Coimbra e Regina Pinto, da Escola Profissional de Cinfães.
Dando as boas-vindas ao concelho de Resende, e como anfitrião, o Dr. Manuel Garcez Trindade, Presidente da Câmara Municipal de Resende, apresentou aos convidados algumas das potencialidades do concelho que têm vindo a ser desenvolvidas, bem como as apostas definidas e que a edilidade levará à execução, salientando o turismo termal e náutico, a produção de cereja e a produção pecuária.
Iniciando o debate, Luís Ramos da UTAD, crítico quanto a algumas discussões sobre o desenvolvimento local e regional, afirmou: “nós preocupamo-nos demasiado em garantir as condições necessárias para o desenvolvimento e não atacamos de frente os problemas do desenvolvimento.” E, disse: “só há desenvolvimento neste território ou noutros se formos capazes de criar valor, criar riqueza, e em segundo lugar, se essa riqueza for fixada localmente, se valorizarmos os produtos locais, criando o tal valor, aumentando a produção nas áreas onde é possível, ou incrementando essa produção dando-lhe capacidade para que esse valor seja gerado e seja fixado.”
Relevando o papel da Dolmen e da abertura das suas novas instalações em Amarante, designado Espaço Douro & Tâmega, afirmou uma vez mais a sua expressão quanto ao desenvolvimento local: “A porta do desenvolvimento abre sempre por dentro. Não esperem que alguém venha desenvolver quem quer que seja, ou os territórios se desenvolvem a si próprios ou então o desenvolvimento não acontece.”
Por seu lado, Regina Pinto, da Escola Profissional de Cinfães, numa intervenção marcada pela sua experiência no ensino profissional, nomeadamente ligado ao turismo, evidenciou alguns aspetos para os quais o território deve olhar, entre os quais a qualidade e a própria qualificação dos diversos agentes turísticos.
“As escolas têm de ser o motor de desenvolvimento das áreas onde estão, porque é de lá que vem o conhecimento, e portanto elas têm de servir de alavanca promovendo o acesso à cultura e à formação dos alunos e não menos importante, das famílias. Eu vejo a escola sempre como uma comunidade que aprende e onde aprendem todos, aprendem os alunos, aprendem os professores, aprendem as famílias, aprende a comunidade e agora até podemos ir mais longe, porque também podem aprender os empresários que recebem os nossos alunos no âmbito da formação em contexto de trabalho sendo a partir desta interação que podemos ir mais longe”, disse Regina Pinto.
Suzan Fartaj, das Termas de Caldas de Aregos, salientou alguns dos aspetos do trabalho desta unidade termal e da forma como está no mercado, direcionando a sua oferta à procura sentida, defendendo que a aposta neste recurso, inserido no Douro, que por si revela uma capacidade de atração da procura internacional, gerará valor e riqueza local, indo de encontro às expectativas da população: “Um dos sonhos da população de Resende é voltar a ver as termas como antigamente, nos anos quarenta, cinquenta, sessenta e isto vai ser um processo gradual.”
Numa intervenção de caráter mais ambiental e de afirmação dos valores da sustentabilidade, Helena Madureira, da Universidade do Porto, começou por saudar a associação da qualidade ambiental e do desenvolvimento na escolha do tema, por considerar ser bastante pertinente e muito atual, com um caráter muito vincado de futuro.
“Só ouvíamos falar de conservação ambiental quando estávamos perante valores excecionais em termos ecológicos ou em termos ambientais e portanto só havia conservação ambiental para as grandes áreas protegidas e para os parques naturais que foram sendo implementados a partir do seculo XIX. Hoje estamos perante um contexto completamente diferente, relativamente à conservação ambiental e que está muito mais próximo de todos os conceitos que envolvem o próprio desenvolvimento”, referiu Helena Madureira.
Especificamente sobre o território do Douro Verde, em debate, disse: “Estes territórios têm um importante património que importa claramente preservar, promover e valorizar, e olhando aqui para o Douro Verde temos alguns elementos importantes em termos de conservação ambiental - podemos falar do Marão, de Montemuro, da Aboboreira -, mas estamos também e sobretudo perante paisagens humanizadas, ou seja, estamos perante paisagens que nasceram de uma atividade económica que obviamente é indissociável de sociabilidades que aqui se desenvolveram, e portanto é um território de produção de bens materiais, é uma paisagem viva, e é todo este capital natural, e havíamos de olhar para todo este capital natural no seu conjunto, não só pelos valores que são excecionais, mas também para todo o território que é composto por estas diversas realidades, desde os locais excecionais até esta paisagem viva que acaba por ser dos aspetos mais marcantes deste território.”
Por fim, João Luís Fernandes, geógrafo da Universidade de Coimbra, direcionou a sua apresentação para uma visão sobre a ocupação do território e as características de desenvolvimento que lhe estão associadas. Reconhecendo que têm sido feitas abordagens aos problemas do desenvolvimento que não estão corretas: “temos começado muitas das vezes a discutir os territórios apontando o que falta a esses territórios - faltam estradas, faltam infraestruturas, faltam equipamentos -, quando, pelo que me parece, devemos começar pelo contrário, devemos começar pelo que nós temos, o que é que efetivamente temos. Só a seguir é que nós podemos discutir o que nos falta.”
Salientado a questão do turismo, e nomeadamente do turismo em espaço rural, referiu: “o turismo tem sido visto como uma panaceia, como uma solução sem lugar para alguns territórios e não para outros, mas uma coisa é certa, não existe turismo em espaço rural sem agricultura, sem criação de gado, sem outras atividades paralelas, ou seja, o turismo em espaço rural tem de ser apenas um vértice de um sistema mais vasto, porque se assim não for corremos o risco de ter turismo, produção de mais-valias, mas não reprodução de capital à escala local e essa é uma questão com a qual devemos ter algum cuidado, a da territorialidade de capital. É evidente que quanto mais atividades tivermos à volta do turismo, mais possibilidades temos de reter localmente essas mais-valias.