Um em cada quatro incêndios florestais a norte do rio Douro ocorre em áreas já queimadas nos dez anos anteriores. A conclusão é do especialista do Centro de Investigação e de Tecnologias Ambientais e Biológicas (CITAB), José Aranha, no âmbito da orientação de uma tese de doutoramento, que defende que a solução passa pelo planeamento e ordenamento do território e pela instalação de florestas mistas.
“Este estudo prova que são incêndios recorrentes e que os povoamentos monocultura, que são os mais comuns em Portugal, são mais propensos quer aos fogos, porque têm continuidade espacial do combustível, quer ao ataque de pragas florestais”, defende José Aranha, investigador do CITAB e docente da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro.
O termo “floresta mista” é utilizado para designar florestas de árvores resinosas (como o pinheiro bravo) e de folhosas (carvalhos ou castanheiros). A floresta portuguesa é plantada em mono cultura, sendo as principais manchas, e as mais preocupantes, as de eucalipto e de pinheiro bravo.
“Do ponto de vista ambiental, deveríamos apostar em florestas mistas pois a presença de várias espécies de árvores fomenta a biodiversidade, o abrigo e a alimentação das espécies animais”, justifica José Aranha. “Mas também do ponto de vista comercial, para obtermos rendimentos financeiros desfasados no tempo (porque as taxas de crescimento e os produtos são diferentes) e porque poderiam reunir melhores condições para a defesa da floresta quer em termos de incêndios, quer contra pragas”, sintetiza.
Na esmagadora maioria dos incêndios florestais, quando há um fenómeno de destruição, desaparece um povoamento inteiro. No entanto, segundo o especialista, “as florestas mistas também são muito mais dispendiosas e difíceis de manter, pelo tipo de gestão que requerem”.
Estratégia deve passar pela criação de modelos de cálculo de perigo de fogo adaptados a cada região
“O correto ordenamento florestal, a gestão florestal (controlo de matos, desbaste regular das árvores e instalação de novos povoamentos mistos, bem como a manutenção dos caminhos florestais) e a instalação de povoamentos com a predefinição do perigo de incêndio daquela zona, permitia-nos minimizar o efeito dos fogos”, alerta José Aranha.
Através do cálculo dos índices de perigo de incêndio, adaptados e calibrados para as várias regiões, em vez da utilização de um modelo para o país todo, os investigadores poderiam centrar as atenções nas zonas onde o perigo é maior, desenhando programas de ordenamento e de gestão florestal que possibilitariam minimizar o perigo de essas áreas voltarem a arder.
Portugal regista mais de um terço do número de incêndios total da Europa
Na mesma linha de investigação, um outro estudo conduzido com a colaboração dos investigadores do CITAB Mário Gonzalez Pereira e Mallik Amraoui, que incidiu sobre vários países do Mediterrâneo (além de Portugal, Espanha, Itália, Grécia e França), permitiu aos especialistas conhecer as dinâmicas dos fogos, a recorrência e qual o tipo de vegetação que mais arde.
O mesmo estudo revela ainda que Portugal tem mais de um terço do número total de incêndios da Europa e um pouco menos de um terço do total de área ardida.
Segundo dados da União Europeia, no período entre 2000 e 2013, verificaram-se quase 19 mil fogos florestais nos países da Bacia do Mediterrâneo (Portugal, Espanha, França, Itália e Grécia), sendo que mais de 10 mil (53,4%) ocorreram em Portugal continental. Em termos de área ardida, contabilizaram-se quase 3,5 milhões de hectares ardidos, dos quais 1,3 milhões (37,7%) foram em território continental.
“É um valor muito elevado que ainda é mais exacerbado se tivermos em conta a relativa pequena dimensão do país face aos outros países com que estamos aqui a comparar, nomeadamente com Espanha,” refere Mário Gonzalez. Tendo em conta a dimensão de Portugal continental, este valor corresponde a 14,7% do território nacional.